Evento marcou lançamento do curso gratuito “Igrejas, Autoritarismo e Violência de Estado no Brasil”
As religiões são importantes meios de socialização e formadoras de imaginários no Brasil: 90% são adeptos de alguma denominação, de acordo com pesquisa do Datafolha, divulgada em 2020. Não por acaso, instituições e representantes religiosos são atores influentes na política, desde a mobilização da sociedade até a presença nos três poderes.

“A igreja católica esteve presente e deu um apoio muito significativo à implementação do regime totalitário no Brasil. As Marchas da Família com Deus pela Liberdade foram muito representativas na explanação do apoio dado ao golpe militar”, lembrou o sociólogo e arquivista João Marcus Figueiredo.
“A igreja católica esteve presente e deu um apoio muito significativo à implementação do regime totalitário no Brasil. As Marchas da Família com Deus pela Liberdade foram muito representativas na explanação do apoio dado ao golpe militar”, lembrou o sociólogo e arquivista João Marcus Figueiredo.
Ao mesmo tempo, a religião católica também deu origem à Teologia da Libertação, que por sua vez inspirou o nascimento das Comunidades Eclesiais de Base, essenciais na crítica à ditadura civil-militar.
Nesse sentido, João Marcus, que também é professor da Unirio, destaca as ações da diocese de Nova Iguaçu. “Ali eram fundamentais a Pastoral da Juventude, a Pastoral Operária e a Comissão Pastoral da Terra”. Ele afirma que é impossível não mencionar o “papel importantíssimo do bispo Dom Adriano Hypólito”.
Assim como ele, outros bispos e padres atuaram na proteção dos familiares de mortos e desaparecidos pela ditadura. É o caso de Dom Paulo Evaristo Arns, quinto arcebispo da Arquidiocese de São Paulo. Jamie Wright, pai da presbítera Anita Wright foi um dos pastores acolhidos pelo arcebispo paulistano quando fez um pedido de socorro pela situação de seu irmão, que foi preso, torturado e morto.
“Foi aí que se estabeleceu uma parceria de trabalho na defesa dos direitos humanos. O principal projeto é o Brasil Nunca Mais, que resgatou registros históricos antes que o sistema oficial da ditadura desse fim a eles. Foi assim que fotocopiaram todos os arquivos do Superior Tribunal Militar”, explica Anita.
Apesar de o regime democrático ter se instalado, ainda hoje convivemos com práticas da ditadura. Anita, a primeira mulher a ser eleita moderadora da Igreja Presbiteriana Unida, exemplifica com uma das frases do pai: “estamos em uma democracia, mas a luta pelos direitos humanos não terminou. Vá para uma delegacia do seu bairro e veja que lá está o homem negro e pobre sofrendo tortura”.
A idealizadora e diretora executiva do programa educacional Odarah Cultura e Missão, Fabíola Oliveira, ressalta: “a gente sabe que para alguns territórios, para alguns CEPs, para alguns CPFs, a democracia é apenas uma vertigem. Parece que estou falando de 1964, mas a gente está falando de agora, de um Estado concentrador de renda, imoral, indecente e perverso e que mata especificamente alguns tipos de corpos, como matou na história passada e continua agora”.
Assista na íntegra:
O historiador Lucas Pedretti também considera importante que a disputa de memória sobre a ditadura é importante para resgatar o projeto que foi implementado no país e a sua continuidade nos dias de hoje, que implica em aprofundamento das desigualdades, genocídio indígena, controle sobre corpos e sexualidades, entre outras violências.
“De fato, o ISER tem uma contribuição gigantesca nesse tema: foi uma das poucas organizações da sociedade civil que deu uma centralidade especial ao tema da Memória, Verdade e Justiça. Isso precisa ser reconhecido e muito valorizado. Não é à toa que o ISER acolhe mais uma vez esse tema e promove esse debate”, disse Pedretti.
A mediação do evento foi da historiadora Gabrielle Abreu, do ISER, que destacou o histórico de pesquisas da organização sobre os temas, bem como a atuação de seus membros e pesquisadores em defesa dos direitos humanos, nos últimos 50 anos.
Evento marcou lançamento de curso on-line nos meses de abril e maio
A live foi realizada em parceria com Frente de Evangélicos pelo Estado de Direito, Paz e Esperança Brasil, Koinonia Presença Ecumênica e Serviço, Fe en la Resistencia, Rede FALE, Usina de Valores, coletivo Memória e Utopia, Intersecções, Grupo Direitos Humanos e Políticas de Memória e Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil.
Para aprofundar as discussões e reflexões sobre o tema, será realizado o curso “Igrejas, Autoritarismos e Violência de Estado no Brasil”. “O curso foi construído a muitas mãos e vai ser realizado de modo gratuito a partir da próxima semana, dia 13/4, às 20h”, informou Flávio Conrado, antropólogo e coordenador da Plataforma Intersecções.
Conheça a programação e saiba mais sobre o curso
Leia também:
– Relatórios e publicações do ISER sobre a Comissão Nacional da Verdade
Por Júlia Boardman