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Lições do 6º congresso Gife

Maria Rita Villela

é antropóloga e pesquisadora do ISER.

Ocorreu entre os dias 7 e 9 de abril o 6º Congresso GIFE (Grupo de Institutos, Fundações, e Empresas) sobre investimento social privado – Visões para 2020. Diante da tão inspiradora proposta, de olhar para o que queremos ver no futuro como mote para nossas ações de hoje, resta saber se esse futuro esperado já não é (ou deveria estar) presente.

O Congresso foi uma oportunidade para reunir grandes lideranças fundadoras do terceiro setor no Brasil, lembrar do mote desse grupo de atores e finalmente demonstrar que o caminho percorrido foi intenso e repleto de aprendizados, mas que não será menos desafiador o que está por vir. Afinal, como afirma Hugo Barreto, presidente da Fundação Roberto Marinho, “o futuro era melhor no passado”.

Pretende-se aqui enumerar alguns pontos relativos à posição e aos objetivos do investimento social privado que foram abordados ao longo dos dias de debate.

A visão do GIFE para 2020 é que o investimento social privado deve ser relevante e legítimo, abrangendo uma diversidade de temas, regiões e públicos e que seja formado por um conjunto sustentável e diversificado de investidores.

Segundo Maria Alice Setubal, presidente da Fundação Tide Setubal, destinada à promoção do desenvolvimento local, os maiores desafios para o futuro, no nível macro, são: 1) a construção de um estado forte, democrático e participativo que possa desenhar políticas públicas de Estado (não só de governo); 2) a construção de uma sociedade civil dotada de acesso à informação; 3) a promoção da institucionalidade da sociedade civil. Para tanto, ela propõe projetos de desenvolvimento local com equidade e sustentabilidade.

Outro ponto abordado na mesa Aprendendo com os erros: fracasso do ISP foi o papel do erro no investimento social privado. Frisou-se muito a importância do fracasso para o aprendizado e melhoria dos investimentos, mas também a dificuldade que as organizações têm de demonstrar esses erros – sobretudo aos investidores.

As avaliações e os monitoramentos dos projetos são frequentemente engavetados e os fantasmas do que deu errado não são devidamente discutidos. Falou-se também que muitos dos erros do ISP (Investimento Social Privado) poderiam ser diminuídos ou até mesmo eliminados através do aprimoramento da comunicação entre investidores e receptores da intervenção. A pergunta que não quer calar, entretanto, continua sendo o debate entre a legitimidade do chamado “marketing social” – tido por muitos como cosmética, e não uma intervenção séria visando a transformação – em oposição ao investimento social efetivo. Claro que a resposta a esse embate é o caminho do meio – ao se fazer investimento social efetivo, espera-se que os resultados reais sejam comunicados e divulgados.

Outra mesa debateu a Inovação e o investimento social de risco. Segundo Barry Gaberman (ex-presidente da Fundação Ford), há dois tipos diferentes de risco: o financeiro e o programático; para o primeiro, recomenda precaução, e para o segundo, ousadia. O segredo para os projetos seria desenhar uma estratégia, criar marcos ao longo do caminho e criar uma estratégia de saída, isto é, pensar como a estratégia sobreviveria depois que o investimento tivesse sido suspenso.

Nessa mesma mesa, Maneto, representante da Fundação Avina, destacou a importância da liderança para o desenvolvimento de projetos inovadores, como a articulação de redes de relacionamento no meio social e no diálogo entre sociedade civil e setor privado.

Já na mesa Discutindo a relação: o investidor, a ONG e a comunidade, destacaram-se alguns fatos que, apesar de parecerem óbvios, são importantes ser lembrados: 1) o investimento social em comunidades dá-se para o benefício das comunidades e não do investidor; 2) a comunidade deve ter informação e compreender que não é somente receptora de uma política, mas também voz ativa nas decisões; 3) as parcerias são importantes , pelo fato de muitos atores serem necessários para a promoção do desenvolvimento comunitário; e 4) os membros da comunidade sentem-se responsáveis pelas ações implantadas.

A maior novidade do Congresso, entretanto, ocorreu em uma sala pequena, com público restrito, em uma atividade paralela chamada Brasil Sustentável: por uma legislação de incentivo a projetos ambientais, organizada pelo GT IR-Ecológico, da Frente Parlamentar Ambientalista (PL5974/2005). Consiste em um projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional que visa criar uma modalidade de projetos ambientais que abatam imposto de renda de pessoas jurídica e física, tal como a Lei Rouanet para projetos culturais. O projeto de lei visa a: 1) dar legitimidade e atrair investimento para o setor ambiental – em um estudo comparativo de 10 países, o Brasil é um dos poucos que não tem legislação consistente com o patrimônio ambiental que encerra; 2) ter uma agenda positiva ambiental, com legislação e pagamento por serviços ambientais; 3) abrir a possibilidade de novos atores no setor ambiental e ainda integrar cidadãos ao objetivo; 4) trazer impactos positivos no setor ambiental através de campanhas de mobilização e preservação, reciclagem, despoluição, inovação, educação ambiental, formação, pesquisas, etc.

O modelo proposto foi inspirado na Lei Rouanet: a organização proponente apresentaria o projeto ao Ministério do Meio Ambiente e à Comissão Nacional de Meio Ambiente, que seriam encarregados de aprovar o projeto e publicá-lo em veículo oficial, permitindo então a captação junto a empresas e cidadãos. As empresas poderiam deduzir do imposto de renda até 6% (competindo com o montante descontado também por projetos da Lei Rouanet). Para se ter uma idéia do impacto que uma lei dessa natureza pode ter em potencial de investimento no setor, ressalte-se: em 20 anos o Fundo Nacional de Meio Ambiente apoiou 1.400 projetos num montante de 230 milhões de reais, ao passo que a Lei Rouanet, em um ano, apoiou 11 mil projetos, somando 1 bilhão de reais.

Enfim, após as águas de abril terem surpreendido o Rio de Janeiro naquela semana, o Congresso lançou um olhar otimista,- e ambicioso (embora não inovador) -, para 2020. As visões para 2020 apontam vícios recorrentes nos projetos sociais a serem superados no futuro próximo e revelam como esses projetos demandam um lento processo de aprendizado para amadurecer e se transformarem.

Isto posto, ponhamos em prática o que já foi dito e repetido tantas vezes, para que cheguemos a um 2020 conforme projetamos.