Nestes duros tempos de aflição e incerteza, seria muito positivo que grupos religiosos, voluntariamente e no espírito da vida, usassem da liberdade para manterem fechados seus espaços de culto durante a pandemia. Sem qualquer necessidade de decisão legal.
Como isso não tem se dado amplamente, a interdição temporária de atividades religiosas em templos, mesmo havendo tensão e controvérsia nestes dias, é uma ação necessária, com base legal e justa, para garantir a vida e o bem comum. Trata-se de uma medida com amparo tanto na Constituição Federal, quanto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário desde 1948. Esta afirma os direitos à liberdade, à liberdade de reunião e à associação, mas, sobretudo, que toda pessoa tem deveres para com a comunidade e o bem coletivo.
A defesa da liberdade de culto faz sentido se for precedida pela defesa da vida, individual e coletiva. No entanto, pessoas e grupos diferentes têm agido paradoxalmente contra a vida ao se contraporem aos saberes científicos, como ilustra o caso notório e público de lideranças religiosas, sobretudo evangélicas e católicas, no Brasil. A aglomeração nos templos se opõe às medidas sanitárias necessárias para conter a disseminação do coronavírus e, como consequência, muitos desses líderes ou seus próprios pares têm perdido a vida. Estão tristemente convergindo pela morte.
O Estado laico garante a expressão de pertencimentos religiosos e a sociedade deve reconhecer sempre a importância da religião na vida pessoal e na dimensão social do país, afinal, somos uma nação com mais de 85% de população identificada por alguma crença religiosa, conforme Censo do IBGE. Respeitando esse cenário e diante do risco de morte que nos assola, é imperativo manter os templos fechados com restrição de atividades presenciais, seguindo as regras sanitárias para defesa da vida e da liberdade coletivas.
Está internacionalmente comprovado pela ciência e pela experiência pública que somente por meio da vacinação e, antes disso, pelo distanciamento social e os devidos cuidados higiênicos de proteção, será possível reduzir as consequências funestas desta pandemia.
Os grupos religiosos, que tanto significam para a maior parte da população, têm condições de prosseguir com atividades à distância, como já tem ocorrido, não somente na forma de reuniões virtuais, mas também no acompanhamento de famílias enlutadas, de doentes amedrontados, de pessoas famintas e sem esperança. Essa é também uma forma de manter comunidades de fé em comunhão para que, após o controle da pandemia, retomem celebrações e demais atividades em seus espaços de culto com todos os direitos, conforme garantidos pela lei. Liberdade jamais deve ser usada para matar ou morrer, mas, sim e sempre, para viver.
Rio de Janeiro, 7 de abril de 2021