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Pesquisa realizada pelo ISER e Observatório de Favelas apresenta dados sobre violência contra jovens

Estudo também sugere medidas para lidar com a crise da segurança pública

A proporção das mortes causadas por agentes do Estado em relação à violência intencional total cresceu de 12,6%, em 2013, a 39,6%, em 2019, no estado do Rio de Janeiro. De acordo com a pesquisa “Vidas adolescentes interrompidas”, realizada pelo ISER e pelo Observatório de Favelas, entre os adolescentes vítimas de mortes violentas intencionais no período, 79% são negros e 76% tinham entre 16 e 17 anos.

Vinte bairros da Zona Norte e três complexos de favelas, Acari, Chapadão e Pedreira, compõem o território mais letal da cidade, com uma taxa de mortes violentas intencionais de adolescentes seis vezes superior à média geral em 2017. O estudo se debruçou sobre as histórias de 25 jovens dessa área, entre os quais Maria Eduarda Alves da Conceição, morta aos 13 anos dentro da escola, durante uma operação policial.

A equipe responsável pelo estudo teve acesso aos documentos relacionados a 25 vítimas, incluindo registros de ocorrência, laudos de necropapiloscopia (identificação da vítima a partir das digitais) e laudos de necropsia (natureza das lesões e causa provável da morte). Nos registros de ocorrência, 14 das 25 mortes violentas de adolescentes foram classificadas como “homicídios provocados por armas de fogo” e nove como “homicídios decorrentes de intervenção policial”.

Apesar de a menina Maria Eduarda Alves da Conceição ter sido morta durante uma operação policial, dentro da Escola Municipal Jornalista Daniel Piza, em Fazenda Botafogo, e com quatro tiros de fuzil, seu caso foi registrado apenas como “homicídio provocado por arma de fogo” pela Polícia Civil. À primeira vista, essa classificação omite o contexto da morte, circunstância essencial para elucidação do caso. Os policiais envolvidos na ação que resultou em sua morte foram presos em flagrante, o que coloca em evidência que o verdadeiro motivo foi a intervenção policial.

“A documentação mostra que as mortes cometidas pela polícia são precariamente investigadas, ocorrendo uma espécie de legalização clandestina do excludente de ilicitude”, observa André Rodrigues, um dos coordenadores do estudo. Segundo o pesquisador, os procedimentos de investigação são extremamente precários e demonstram “pouca disposição do Estado em solucionar essas mortes e responsabilizar seus autores”.

Além de analisar a atuação policial no território e o andamento das investigações das mortes e apurar como a rede de proteção se fez presente nas trajetórias desses adolescentes, o diagnóstico busca orientar e subsidiar a atuação do Comitê para Prevenção de Homicídios de Adolescentes no Rio de Janeiro, lançado em 2018 pela Unicef. Depois de mais de três anos das mortes, apenas duas foram denunciadas à justiça pelo Ministério Público.

“Tendo em vista a conjuntura que atravessamos, na qual há um acirramento da violência estatal, com as polícias descumprindo ilegalmente os parâmetros de controle das operações policiais impostos pela ADPF 635 e criminalizando abertamente ativistas, lideranças e moradores de favelas e periferias, temos muito com o quê nos preocupar”, lamenta o pesquisador.

No entanto, é possível transformar essa realidade e evitar ou reduzir a ocorrência de mortes violentas entre jovens. Entre as medidas de prevenção propostas pelo estudo estão o fortalecimento das equipes e estrutura dos equipamentos públicos, a criação de políticas específicas para adolescentes negros, que os considerem como sujeitos de direito dotados de vitalidade, criatividade e dignidade, a realização de ações de reparação e atenção às famílias de vítimas de homicídios, a revisão dos padrões de atuação policial em favelas e periferias e o aprimoramento das investigações e dos procedimentos periciais.

A pesquisa “Vidas adolescentes interrompidas” é resultado de uma articulação entre ISER, Observatório de Favelas, Laboratório de Análise da Violência da Uerj, Centro de Pesquisas do Ministério Público e Unicef no âmbito do Comitê para a Prevenção de Homicídios de Adolescentes do Rio de Janeiro.

Baixe aqui o estudo completo

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