No Brasil, o cenário político no debate sobre o direito ao aborto é desolador. Trata-se de um assunto que divide o governo, cujo principal partido é o PT (Partido dos Trabalhadores) – que teve suas origens em comunidades eclesiais de base, associadas à Igreja Católica -, e que foi divisor eleitoral no debate político do último pleito para presidente da república, em 2010. Na campanha eleitoral que levou Dilma Rousseff à presidência, ela teve que assumir compromissos no sentido de não fazer alterações ao Código Penal em relação ao aborto. No legislativo, Jandira Feghali, deputada federal, e Marta Suplicy, senadora que atualmente ocupa o Ministério da Cultura, são exceções nos discursos dos parlamentares, em geral, conservadores. Provavelmente associado a isto está o baixo número de representantes – menos de 9% na Câmara dos Deputados e 13% no Senado – do sexo feminino.
No Judiciário, os holofotes se voltam para o Supremo Tribunal Federal (STF), que tem a competência de controlar a constitucionalidade de leis e decisões judiciais. Recentemente, no julgamento da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nᵒ54, houve um pequeno progresso com decisão de que seria inconstitucional vedar às gestantes de fetos anencéfalos o direito de interromper a gravidez – ou antecipar o parto, conforme o vocabulário utilizado. No entanto, na audiência pública que antecedeu a decisão judicial, vários grupos religiosos manifestaram-se para tentar impedir essa decisão e para que esta não acabasse tornando o aborto legal. Os ministros do STF tomaram o cuidado de restringirem-se aos casos de anencefalia e, ao que se percebe da análise de seus votos, a maioria não seria favorável à extensão do aborto a outros casos que os já autorizados legalmente – em caso de risco à saúde da mãe e estupro.